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Gestão escolar: como e por que incentivar o trabalho por projetos?

Gestão escolar: como e por que incentivar o trabalho por projetos?

Flávia Siqueira
08/09/2022
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Professor e pesquisador Alexsandro Santos compartilha reflexões e três mudanças necessárias para fomentar o letramento científico na era digital

Estudantes motivados(as), professores(as) valorizados(as), uma escola conectada com as potencialidades do território e capaz de lidar com os desafios dos nossos tempos — essas são características que certamente fazem parte da escola pública que queremos construir. Mas como partir da realidade atual rumo a esse cenário que idealizamos? Existem caminhos possíveis, e a gestão escolar, personificada nos cargos de direção e coordenadoria pedagógica, tem papel central nessa construção.

Com o objetivo de auxiliar as escolas públicas brasileiras a iniciarem esse percurso, o programa Solve for Tomorrow Brasil — iniciativa global de Cidadania Corporativa da Samsung, com coordenação geral do Cenpec no país — lançou, em sua 9ª edição, uma página voltada justamente às equipes responsáveis pela gestão administrativa e pedagógica: O papel da gestão escolar em projetos STEM (sigla em inglês para Ciência, Tecnologia, Engenharia e Matemática). O conteúdo, que se soma aos materiais de apoio voltados a docentes e estudantes, aborda temas como gestão articulada, formação docente, práticas investigativas e organização dos espaços escolares.

Também no âmbito da 9ª edição, o programa realizou no primeiro semestre de 2022 o evento virtual Encontro de Alianças - O papel da gestão escolar para uma escola curiosa, criativa e relevante, que teve como palestrante o professor e pesquisador Alexsandro Santos, diretor-presidente da Escola do Parlamento da Câmara Municipal de São Paulo, doutor em Educação pela Faculdade de Educação da Universidade de São Paulo (FE-USP) e docente do programa de pós-graduação da Universidade Cidade de São Paulo.

Em sua apresentação, voltada a gestores(as) escolares de todo o país, Alexsandro falou sobre a importância do letramento científico e a necessidade de realizarmos três “deslocamentos” (mudanças) na escola para torná-lo efetivo. Compilamos, a seguir, alguns destaques da fala do professor.

Letramento científico com equidade

“Esta é uma realidade incontornável do terceiro milênio: a sociedade precisa lidar com a aceleração e a expansão do uso das tecnologias. Estamos diante de um ecossistema de vida digital que exige a formação de meninos e meninas para viverem num mundo que demanda um alto grau de conhecimento científico e das lógicas de inovação.”

E a escola que se vê diante dessa demanda é a mesma que enfrenta outros desafios. Alguns deles são bem conhecidos, como os problemas de infraestrutura e o baixo desempenho brasileiro em avaliações como o PISA. Outros, aponta Alexsandro, exigem um olhar mais atento aos dados para serem identificados — é o caso das desigualdades de raça, classe social e gênero que se “escondem” dentro das estatísticas divulgadas. Boa parte dos(as) estudantes brasileiros(as), por exemplo, sequer alcança os índices (já baixos) divulgados pelo PISA. Além disso, pessoas negras e mulheres ainda são minoria nos cursos universitários voltados a ciências exatas, matemática e tecnologia.

Se o objetivo, para além de melhorar os números brasileiros em testes internacionais, é formar jovens capazes de compreender um mundo pautado pela ciência e tecnologia e de tomar boas decisões dentro dessa realidade, é necessário trocar a lógica meritocrática por uma lógica de justiça e equidade. Uma possibilidade é definir um piso de desempenho e aprendizagem — a ideia, explica Alexsandro Santos, é que nenhum estudante fique abaixo desse parâmetro. 

Alexsandro Santos:
“Um projeto didático nunca está preso só ao que acontece na escola, ele sempre dialoga com um desafio que está posto na vida social. Por meio dele, os estudantes podem pensar em soluções para problemas do presente e do futuro.”

(foto: arquivo pessoal)

Três deslocamentos necessários

Trabalhar sob o critério da equidade, prossegue Alexsandro, exige mudanças dos formatos de ensino-aprendizagem em ciências e matemática — transformação que requer a liderança de profissionais e equipes de gestão escolar. “O primeiro deslocamento é sair de uma lógica de aprendizagem individual para uma lógica de aprendizagem colaborativa e coletiva, de forma que os alunos e alunas troquem entre si aprendizagens, competências e habilidades. Há evidências de que os estudantes aprendem muito mais colaborando do que competindo.” 

Para viabilizar esse movimento, a escola provavelmente precisará rever a forma como organiza sua grade e sequência de aulas, já que o trabalho em grupo inclui elaborações, aprofundamentos e trabalhos de pesquisa que demandam mais do que os tradicionais 45 minutos por aula.

O segundo deslocamento é considerar os conteúdos como um meio, e não um fim da situação didática. Portanto, a lógica da aula não deveria ser organizada pelo conteúdo, mas pelo objetivo de aprendizagem. Sim, o conteúdo é importante, é o bem social que a escola distribui, mas ele não deveria governar a situação de ensino e aprendizagem.” Como a maior parte dos materiais didáticos e a própria formação docente se organizam por conteúdos, colocar essa mudança em prática demanda estratégias de formação continuada para professores e professoras.

Como terceiro deslocamento, Alexsandro Santos cita o trabalho por projetos didáticos — justamente a proposta do Solve for Tomorrow Brasil. “Os projetos têm um aspecto fundamental: eles representam a conexão dos conteúdos escolares com a prática social. Um projeto didático nunca está preso só ao que acontece na escola, ele sempre dialoga com um desafio que está posto na vida social. Por meio dele, os estudantes podem pensar em soluções para problemas do presente e do futuro.”

Colaboração docente e infraestrutura

Colocar em marcha esses três deslocamentos, ressalta o professor, é realizar uma mudança cultural que requer tempo, persistência e intencionalidade por parte de gestores(as) escolares. É preciso incentivar os professores e professoras a pensar em outros modos de ensinar ciências e matemática. 

Alexsandro propõe algumas reflexões para as equipes de gestão: “será que permitimos que os professores encaminhem pedidos de materiais e outros recursos que eles precisam para desenvolver seu trabalho? Será que estamos criando, na escola, um espaço de reflexão sobre práticas pedagógicas? Muitas vezes, professores e professoras ficam isolados não apenas com seus problemas, mas com um tesouro — boas soluções que eles encontraram e que poderiam ajudar os colegas. Se não criamos um ambiente colaborativo, não fazemos com que isso apareça na escola”. 

É claro que parte da solução depende de ajustes em políticas públicas, melhorias de infraestrutura e de decisões tomadas em outros níveis da administração, mas equipes de docentes e gestores(as) escolares podem dar grandes passos rumo a uma aprendizagem mais significativa. “É necessário tomar cuidado com o argumento de que produziremos qualidade apenas quando houver as condições ideais. Precisamos desenhar soluções que caibam nessa escola que existe agora, enquanto lutamos pela escola com a qual sonhamos.”

Que tal se inspirar?

Os projetos vencedores e participantes das nove edições do Solve for Tomorrow mostram que, ao aliar colaboração e criatividade, educadores(as) e estudantes brasileiros têm talento e inspiração de sobra para colocar grandes ideias no mundo em diferentes contextos. 

Então, deixamos um convite: confira os projetos vencedores em todas as edições do programa e acesse nosso banco de práticas e planos de aula.

TAGS: STEM Metodologia de Projetos Prática Pedagógica Conhecimento Científico